Ultimamente venho lembrando muito do meu avô, pai do meu pai, que embora tenha estudado apenas até o quarto ano, foi um dos homens mais inteligentes que conheci. Afinal, acho que sabedoria, disciplina, retidão não se aprende mesmo na escola e muito menos nos livros... Era um homem calado, sério, austero, religioso, tipicamente capricorniano. Durante mais de vinte anos ele foi um guerreiro impecável e lutou, até ser finalmente vencido pelo câncer.
Lembro dos seus últimos anos de vida, dos quais passou bastante tempo aqui no meu apartamento, enquanto enfrentava dolorosas cirurgias e infinitas sessões de quimioterapia. Ao final de um destes embates, ele estava radiante e cheio de esperanças. Finalmente liberado para sair de casa, estava feliz, pois poderia ir até o mercado comprar o bacalhau que ele gostava que minha avó preparasse, caminhar até a banca para buscar o jornal, assistir a missa na igreja de Santo Antônio aqui do lado. E do alto dos seus oitenta e poucos anos de idade, abriu a porta do elevador, se deparou com uma moça bonita, abriu um sorriso e para a nossa surpresa, lançou, todo sedutor: “Good night!”. A moça, que não esperava pelo galanteio, sorriu de volta.
Como é bonito ver um homem se libertando, e aos oitenta e poucos anos, se permitindo brincar, ser criança, sem ter medo do ridículo. Porque o ridículo só existe mesmo para o ego, nunca para a alma que de repente desperta e sente uma profunda gratidão pelo milagre da existência. Nos últimos anos de vida, meu avô se tornou um homem festeiro, sorridente e bem humorado. Adorava ler Harry Potter, ver os filmes da Julia Roberts e fazer churrasco nas festas de final de ano. E, embora bebesse sua cervejinha todos os dias, nunca me lembro de tê-lo visto embriagado.
Segundo a astrologia, os que têm o privilégio de chegar aos 84 anos, podem experienciar o retorno de Urano, quando este planeta que caminha a passos lentos completa uma volta inteira ao redor do sol, encontrando novamente seu ponto de origem no nosso mapa astral. Urano simboliza o original, o irreverente, o criativo. Suas dádivas são a inovação, a ousadia, a liberdade, o cruzamento das fronteiras saturninas do ego e do superego. Na velhice, simboliza a sabedoria aliada à inocência da criança interior. Representa o brilho nos olhos daqueles que perderam o medo, pois sabem que a morte não é o fim. Mas que ainda assim, são capazes de se maravilhar com a vida, e carregam consigo a curiosidade e o conhecimento de que, deste ou daquele lado do véu que separa os mundos, haverá sempre muito o que aprender.
Saudades de você, véio Geraldo.
Acho que ele não gostava muito do Caetano não, e nem eu ando gostando mais ultimamente, mas acho essa música bonita e creio que ele não se importaria...
Nenhum comentário:
Postar um comentário